O artista à sombra do anonimato

Não que dinheiro realmente avalie alguma coisa, ou tampouco a atenção massiva das multidões sedadas, porém, se por um lado esta liberdade anônima liberta, ela também nos acorrenta à nossa própria solidão. É por gritarem e não serem ouvidos que muitos desistem de gritar, ou mesmo passam a desacreditar nas próprias denúncias. Entristece-me ver a ode cega a clássicos de outras épocas, exaltações absolutas a obras e gostos importados, enquanto ignoramos as súplicas existenciais de nossos próprios vizinhos, que clamam, sentem e retratam nossa própria realidade. O que me incomoda não é que haja clássicos, mas que eles detenham uma exclusividade asfixiante que nos aliena de nosso próprio mundo. Estou farto de neve, de romances mediterrâneos, de conflitos medievais. Quero ver a nós mesmos, plenos em nossa história e cotidiano; e sei que estamos ali, em algum lugar! Em produções artísticas domésticas, viscerais e sublimes que se escondem debaixo de nossos olhos, invisibilizados pela desatenção mórbida.
Quantos artistas grandiosos não morrem na surdina, longe da atenção pública? Quantos Machados e quantas Clarices não enterramos sem ao menos saber? Trata-se não apenas de representatividade, mas sobretudo de oportunidade; de dar voz aos vencidos, a quem vive o aqui e agora. Eu quero encontrar os Dostoiévskis tupiniquins e escutar o que eles têm a dizer. E você?